Esta exposição virtual resulta do roteiro composto por um conjunto de peças que integram a exposição permanente e que, em virtude da celebração da Páscoa, foram exploradas em exposição temporária, tendo em conta a função do culto e devoção privados, próprios desta festa religiosa, que decorreu no MQC, entre os dias 5 e 28 de abril de 2023.
Contou com cerca de duas dezenas de peças, localizadas entre o edifício principal e a Capela, de invocação à Nossa Senhora da Piedade, ao longo do percurso, puderam ser encontrados testemunhos que marcam a dinâmica cristã celebrada nesta quadra, desde cenas alusivas à meditação da Via Sacra, passando por um conjunto expressivo de Cruzes de Banca ou de Altar, dois Oratórios, o Porta – Paz – obra de referência da ourivesaria portuguesa do século XVI – e o Menino Jesus Bom Pastor, que reflete o cruzamento de influência entre o ocidente e o Oriente, dando origem a uma das interpretações mas originais de Jesus, e que se celebra no 4º Domingo de Páscoa, o Domingo do Bom Pastor.
Entre a seleção realizada para este roteiro, destacamos as pinturas Verónica seca a face de Cristo a caminho do Calvário (MQC 1315) e Ecce Homo (MQC 250), que retratam as vivências de uma época cuja produção baseada na encomenda privada fruto de um novo tipo de religiosidade orientado para a meditação, inspirada na Devotio Moderna, executadas na Flandres. No século XV Madeira é um entreposto comercial de excelência, de portas abertas ao Novo Mundo, estabelecendo fortes relações comercias com Flandres, exportando açúcar, importando obras de arte (pinturas, esculturas e trípticos) produzidas nos centros de Antuérpia, Bruges e Malines. A produção sacarina atinge o seu esplendor nos anos 20 do século XVI coincidindo com a maioria das obras de arte flamengas existentes na ilha evidenciando esta prosperidade comercial.
No início do século XVI, com a descoberta de Goa, surge-nos uma arte resultante da miscigenação derivada da colonização, da propaganda missionária da Companhia de Jesus e das trocas comerciais de Portugal com o Oriente. O Bom Pastor (MQC 137) considerado o melhor exemplo de miscigenação simbólica entre Portugal e a Índia, as banquetas ou calvários de assento (MQC 1910) e (MQC 2191), considerados como as principais tipologias da imaginária luso-oriental do final do século XVI e século XVII.
Apesar do espírito controlador da Contrarreforma, dominante nos séculos XVI a XVIII, constatou-se uma mútua apropriação dos receituários artísticos português e asiático, promovendo o surgimento de novas linguagens formais e figurativas dando origem assim, a uma arte direcionada para o mercado de exportação, da qual a Leiteira MQC 1926, com a representação da Crucificação de Cristo, é o exemplar desta apropriação.
A arte nos séculos XVII e XVIII, em Portugal, continua a refletir a crença na fé cristã, tendo a imagem um forte caráter instrutivo e moralmente exemplar para os fiéis, a fim de persuadi-los. A exaltação de sentimentos, de movimento e a contorção por vezes exagerada no tratamento das formas e o recurso aos dourados conferem uma grande carga teatral. Exemplo desta, podemos observar a pintura Descida da Cruz (MQC 2139) assinada por Bento Coelho da Silveira, e que se encontra na Capela, onde o artista pretende assim, suscitar os sentimentos do observador através da carga dramática conferida às figuras e ao tema por ele tratado.
“Vivências da Pascoa” é, pois, um convite a um olhar atento e ao encontro entre a arte e a devoção cristã presente no culto doméstico / particular.
Exposição Online
Coordenação: Teresa Pais
Montagem e inserção de conteúdos: Andreia Morgado, Gabriela Nóbrega e Joana Veiga França